Mostrando postagens com marcador Cotidiano. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Cotidiano. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 28 de junho de 2016

Banca SP

Devo muito aos jornaleiros. Minha mãe me ensinou a ler. Mas quem me ensinou a gostar de ler foi a banca. Me parecia um lugar mágico, muito mais que uma biblioteca, porque sempre renovada, sempre em mutação, sempre quente. Eu gostava do seriado do Batman e do mundo mágico de Walt Disney, então comecei a ler Batman e os gibis dos patos. E o Manual do Escoteiro Mirim. E mais quadrinhos, e mais revistas, e livros bons e baratos.

Isso foi nos anos 70. De lá para cá a banca virou uma coisa bem diferente, e nossas necessidades de informação, conteúdo, mágica são atendidas de maneira muito mais diversa. O papel é só uma parte da informação que acessamos.

As bancas são também um centro importante de fomento cultural. A cena nacional de quadrinhos seria completamente diferente se nos anos 80 um grupo de artistas, jornalistas e fãs de HQ não tivessem passado a frequentar a banca Tiragem Limitada - que daria origem à loja Comix. Outras bancas reúnem outros grupos, até hoje.

E as bancas, claro, são um centro de convivência. O jornaleiro da esquina é parte da comunidade. Presta serviço a quem vive no pedaço, a quem está de passagem, presta informação, bate papo. O jornaleiro vive de entender sua rua, seu bairro, seu leitor.

Por isso tudo é que é importante que a banca sobreviva. Mas para sobreviver, a banca tem que mudar. E tem que mudar, inclusive, a sua fonte de receitas. Só revista, nos dias de hoje, não sustenta uma banca. Aí é que as bancas começam a ter um mix diversificado de produtos, conforme a necessidade do seu mercado. Mas isso não é o suficiente.

Por isso é que nos últimos dez anos, o número de bancas em São Paulo caiu de sete mil para 3500 bancas. Claro que tem as bancas melhores e as piores. Mas hoje, juntando a mudança no comportamento do leitor e a atual crise econômica, mesmo as melhores estão em apuros.

Devo tudo como profissional e empresário à banca. Fiz e faço revista e livro para jovem, inclusive criança bem pequena. Te garanto que as bancas continuam sendo centros importantes de difusão de informação e de opinião. E que elas seguem alimentando o amor à leitura.

Tenho interesse prático que as bancas sobrevivam, porque sou jornalista e editor (além de curioso profissional e fuçador da internet...). Veja bem, não morro de fome se todas as bancas fecharem amanhã. Mas já rodei o mundo e sei que cidade civilizada é cidade com banca boa na rua.

E por isso tudo é que é muito importante a aprovação do Projeto de Lei 236/2016, também conhecido como "Banca SP". Ele será votado nesta terça-feira. Foi aprovado na primeira votação, esta é a segunda.
Permitirá que as bancas paulistanas possam veicular publicidade em quatro espaços: um anúncio em cada lateral e dois na parte de trás da banda. Hoje já é assim, mas só pode ter publicidade de produto editorial. Com a lei a banca passa a poder ter publicidade de outros segmentos, como é hoje com os pontos de ônibus e relógios.

A palavra chave aí é "poder". Não quer dizer que todas as bancas farão isso. A adesão será totalmente voluntária. Por isso o argumento de que esse projeto de lei vai contra a Lei da Cidade Limpa é furado. A maioria das bancas hoje já tem cartazes anunciando revista e livros. Uma parte das bancas, provavelmente as que estão em localização mais privilegiada, com visibilidade maior, passarão a ter, em vez de cartazes de revista, cartazes anunciando automóvel, suco, tênis ou o que fôr.

O jornaleiro é um um pequeno empresário. Como em qualquer segmento, existem os mais empreendedores e os menos. Essa lei pode beneficiar muitos pequenos negócios. Fazer isso de maneira descentralizada. Ela exige contrapartidas.

O jornaleiro que aderir terá que fazer melhorias na sua banca, que vai desde trocar a estrutura metálica até colocar e cuidar de bancos e banheiro público. Melhor para a cidade. E veja só: uma parte desta receita extra irá como imposto para a própria prefeitura, e não para um caixa comum, mas justamente para o Fundo Municipal de Mobiliário Urbano e Paisagem Urbana.

Urbanistas importantes dizem que o projeto Banca SP é bom e moderno. Mas interesses poderosos estão querendo solapar esse projeto. Por interesse econômico das grandes empresas que hoje controlam a publicidade nos pontos de ônibus o relógios. Ou são colunistas que fizeram parte da administração Kassab, e aí é um interesse eleitoreiro, que simplesmente vai contra tudo que o atual prefeito faz ou propõe.

Não se trata de gostar ou não de Kassab ou Haddad. Não vamos politizar uma questão que é de todos. Idéia é boa é boa, não importa de onde venha. É mesquinhez fazer de São Paulo uma cidade mais burra. Nossas ruas são mais civilizadas com as bancas; nossas crianças aprendem a gostar de ler nas bancas; o jornaleiro presta um serviço importante pra gente. Vamos proteger isso e apoiar o Banca SP.